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“Imposto do pecado”: Senadores apresentam emendas para retirar bicicleta do Imposto Seletivo

Por 6 de outubro de 2023outubro 9th, 2023Indústria, Notícias, Tributação

Na primeira semana de outubro, a equipe da Aliança Bike esteve reunida em Brasília com senadores de diferentes partidos para apresentar a campanha #SALVEABIKE, que busca retirar as bicicletas da incidência do Imposto Seletivo como está atualmente no texto da Reforma Tributária aprovado na Câmara dos Deputados. A campanha já reuniu mais de 27 mil apoiamentos de pessoas de todo o país.

A receptividade no Congresso Nacional foi surpreendente e já três senadores, Laércio Oliveira (PP-SE), Nelsinho Trad (PSD-MS) e Weverton (PDT-MA) apresentaram emendas para excluir as bicicletas da incidência do Imposto Seletivo, justificando a medida pela importância da bicicleta no combate às mudanças climáticas e na garantia de acesso a um meio de transporte sustentável e acessível para a maior parte da população.

Também os textos argumentam sobre o risco do uso do Imposto Seletivo – criado com a finalidade de taxar produtos nocivos à saúde das pessoas e do planeta – sobre um bem de natureza sustentável que contribui com a agenda 2030 da ONU, da qual o Brasil também é signatário e precisa garantir políticas que caminhem nesse sentido.

Confira abaixo a íntegra das emendas e, nos links, as publicações no site do Senado.

Emenda apresentada pelo Senador Laércio Oliveira (PP-SE) 

Emenda apresentada pelo Senador Nelsinho Trad (PSD-MS)

Emenda apresentada pelo Senador Weverton (PDT -MA)

 

Acrescenta-se o § 5º, ao art. 92-B do ADCT, nos termos do art. 2º da PEC nº. 45 de 2019, com a seguinte redação:

“Art. 92-B. As leis instituidoras dos tributos previstos nos arts. 153, VIII, 156- A e 195, V, da Constituição Federal estabelecerão os mecanismos necessários para manter, em caráter geral, o diferencial competitivo assegurado à Zona Franca de Manaus nos arts. 40 e 92-A, e às áreas de livre comércio existentes em 31 de maio de 2023, nos níveis estabelecidos pela legislação relativa aos tributos extintos a que se refere o art. 124, todos deste Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.

§ 1º Para fins do disposto no caput, serão utilizados, individual ou cumulativamente, instrumentos fiscais, econômicos ou financeiros, inclusive a ampliação da incidência do imposto de que trata o art. 153, VIII, da Constituição Federal, para alcançar a produção, a comercialização ou a importação de bens que também tenham industrialização na Zona Franca de Manaus ou nas áreas de livre comércio referidas no caput, garantido tratamento favorecido às operações originadas nessas áreas incentivadas.
(…)

§ 5º A ampliação da incidência do imposto de que trata o art. 153, VIII, prevista no § 1º não alcançará a produção, a comercialização ou a importação de bens de mobilidade movidos a propulsão humana e que, por sua natureza, não gerem emissões de gases de efeito estufa.”

Justificação

O texto da PEC1 45/2019, que propõe a reforma tributária do consumo, trata primordialmente, da implementação de dois novos tributos, a CBS2 e o IBS3. Essas novas exações trarão maior simplicidade ao atual sistema, justamente por promoverem uma sistemática não cumulativa, com legislações uniformes e base de incidência bem definida.

Por outro lado, a PEC 45/2019 criou, também, através da inclusão do inciso VIII ao artigo 153 da CF4, a previsão de um Imposto Seletivo – “IS” em substituição ao IPI5, que será instituído pela União e incidirá sobre todos os bens e/ou serviços tidos por prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente, vindo a ser, posteriormente, regulamentado em Lei Complementar.

Da leitura do texto proposto, extrai-se, por lógica, que bens e serviços que não apresentarem grau de nocividade à saúde e ao meio ambiente deverão ser excluídos do campo de incidência do IS.

Contudo, de acordo com a redação proposta para o § 1º do artigo 92-B do ADCT7, o IS poderia ter sua incidência ampliada “para alcançar a produção, a comercialização ou a importação de bens que também tenham industrialização na Zona Franca de Manaus ou nas áreas de livre comércio”, existentes em 31 de maio de 2023, “garantindo tratamento favorecido às operações originadas nessas áreas incentivadas”.

Pela aplicação do artigo 92-B do ADCT, quando o bem fabricado em outra região do país concorrer com a produção da ZFM, poderá ser onerado pelo IS. Ou seja, a tributação seletiva passa a se tornar ordinária e incidente sobre bens que estão fora do escopo do artigo 153, inciso VIII da CF.

Não há dúvidas da importância do desenvolvimento socioeconômico para a região, mas isso não deveria ser feito às custas de se distorcer a estrutura constitucional do IS. Tal constatação não escapou da análise preliminar da PEC 45/2019, realizada pelo Núcleo de Estudos e Pesquisas da Consultoria Legislativa dessa Casa. Veja-se:

“O segundo problema é a sobreposição de funções do IS, que, no substitutivo, assumiu também a tarefa de garantir o diferencial competitivo das indústrias localizadas na ZFM (art. 92-B do ADCT). Essa atribuição não consta do art. 153 da CF e não fica claro se o IS poderá satisfazer esses dois objetivos. De qualquer forma, trata-se de uma distorção de seus propósitos.”

Em verdade, a ampliação irrestrita da incidência do Imposto Seletivo poderia levar a resultados indesejados e até mesmo desastrosos para a política ambiental brasileira.

Há que se recordar que o Brasil é signatário do Acordo de Paris e se comprometeu a adotar políticas de transição para a economia de baixo carbono, como a redução de 37% das emissões até 2025 e 50% até 2030, alcançando a neutralidade climática até 2050.

Para alcançar tal objetivo, muito precisará ser feito na área de energia, especialmente em relação a transportes, o setor de maior consumo de combustíveis fósseis no país e, consequentemente, o principal subsetor energético que mais emite gases de efeito estufa no país.

Daí a necessidade de estimular-se a adoção de modais alternativos de transporte, em especial aqueles classificados pelo Código de Trânsito como de propulsão humana – ou seja, que exigem esforço humano, e não a queima de combustíveis para sua propulsão.

Nesse contexto, imagine-se o contrassenso que seria tributar a produção de bicicleta – produto que promove qualidade de vida a partir da mobilidade e atividade física – somente para estimular a industrialização no âmbito da ZFM. Onera-se pelo IS um bem que promove saúde e que contribui com o meio ambiente, mediante a descarbonização da matriz de transporte, na contramão daquilo que o artigo 153, VIII, visa proteger.

Em realidade, a Reforma Tributária deveria estimular a indústria da bicicleta e não a prejudicar. Segundo levantamento realizado em 2020 pela Associação Brasileira do Setor de Bicicletas – Aliança Bike, as indústrias de bicicletas sofrem com uma alta carga tributária, de 80,3%, muito acima de países da União Europeia, Estados Unidos e Japão, e, supreendentemente, acima de e, supreendentemente, acima de bens produzidos no Brasil que podem gerar externalidades negativas, como veículos automotores movidos a combustível fóssil e tabaco, tributados
em média a 42% e 73%, respectivamente.

Do ponto de vista econômico, conclui o referido estudo que “em um país cuja renda média mensal per capita está em R$ 1.373,00, onde os gastos médios com transporte superam 18% da renda, ampliar o acesso dos cidadãos brasileiros a bicicletas mais baratas e de melhor qualidade se apresenta como uma política de importância ímpar, inclusive para a agenda de redução das desigualdades e da pobreza.”

No caso das bicicletas, segundo o estudo Transport and Climate Change elaborado pela instituição internacional SLOCAT, avaliando-se dados amostrais comparativos, uma mesma faixa ou via pública de 3,5 metros tem a capacidade de gerar a mobilidade para um número de pessoas 7 vezes maior do aquele que seria viável se o meio de transporte usado fosse o carro. Nessa comparação, a utilização da bicicleta não gera a emissão de gases de efeito estufa, ao passo que a utilização do veículo representa, apenas em uma hora, a emissão de 107g de carbono por pessoa.

Ainda de acordo com a pesquisa, utilizando-se a cidade de Bogotá como referência, um aumento de apenas 20 a 25% das viagens por meio da utilização das bicicletas podem implicar na redução das emissões decorrentes dos transportes em 6,9%.

Adicionalmente à mitigação das mudanças do clima, tem-se que a utilização de bicicleta é determinante para a mitigação de outros efeitos adversos à mudança do clima, como a poluição sonora, a produção de resíduos gerados pelo transporte motorizado e da contaminação de solo e água pelo vazamento de óleo, combustíveis e outros efluentes líquidos.

E não é demais lembrar que a busca pela externalidade ambiental positiva é uma das pautas da Suframa13, autarquia responsável pela administração da ZFM.

Não se está aqui pleiteando a extinção do tratamento diferenciado e privilegiado à ZFM. Existem inúmeros outros mecanismos fiscais – por meio do IBS e CBS, por exemplo – e financeiros, para se manter esse modelo econômico constitucionalmente protegido. De qualquer modo, ainda que se amplie a incidência do IS para produtos que concorram com a ZFM, deve ser garantido tratamento diferenciado para aqueles que se apresentam como opções sustentáveis.

Pretende-se, portanto, com esta emenda, reforçar a lógica constitucional de proteção ambiental que permeia o texto da reforma tributária (art. 145, § 3º14), bem como evitar seja atribuído ao IS uma função indutora desconectada das finalidades previstas no inciso VIII do artigo 153 da CF.

Nesse sentido, requer-se o apoio dos meus pares para a alteração do art. 92-B do ADCT, de forma a prever que a ampliação da incidência do IS não alcançará a produção, a comercialização ou a importação de bens de mobilidade urbana, por meio de propulsão humana e, que por sua natureza, não gerem emissões de gases de efeito estufa.

Diante do exposto e pela relevância da matéria, conto com o apoio dos nobres Pares.

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Aliança Bike

Criada em 2003 e formalizada em 2009, a Aliança Bike tem como missão principal fortalecer a economia da bicicleta, além de trabalhar para que mais pessoas pedalem no Brasil. A entidade atua em diversas frentes de trabalho para atingir os objetivos. Conta com mais de 180 associados entre fabricantes, montadores, importadores, distribuidores e lojistas.

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